Em meio à crescente conscientização sobre a sustentabilidade e as questões ambientais, sociais e de governança, cuja sigla é “ASG” ou sua sigla correspondente ao termo em inglês, “ESG - environmental, social e governance”, o mercado de seguros está à beira de uma revolução com a implementação do Open Insurance.
A Resolução CNSP n.º 415/2021 introduz o Open Insurance no Brasil visando estruturar e padronizar o modo como os dados pessoais são compartilhados e utilizados no setor. Paralelamente, a Circular Susep n.º 666/2021 estabelece as diretrizes de sustentabilidade para as sociedades seguradoras, entidades abertas de previdência complementar, sociedades de capitalização e resseguradores locais (denominadas “sociedades supervisionadas”), alinhando-as aos princípios ESG. É nesse contexto que a presente análise visa explorar a interseção entre essas duas iniciativas regulatórias, destacando como o Open Insurance pode catalisar práticas ESG no setor de seguros e na sociedade.
Inicialmente, é necessário registrar que práticas ESG surgem da necessidade de expandir a responsabilidade das corporações para além da geração de lucro, promovendo transparência, justiça e cuidado com as pessoas e com o planeta. Em um breve resumo, a governança abrange práticas para uma gestão mais eficaz e transparente; a vertente social refere-se ao impacto da empresa na sociedade; e o componente ambiental destaca a interação da empresa com o meio ambiente, visando práticas que atenuem danos e promovam a sustentabilidade. Esses critérios formam um arcabouço para iniciativas que buscam aprimorar medidas de governança corporativa, o bem-estar social e a responsabilidade ambiental.
Ao dispor sobre o assunto no mercado de seguros, previdência complementar, capitalização e resseguros, a Susep se apoiou em iniciativas internacionais e nacionais, mostrando-se altamente comprometida com seu papel indutor no setor econômico que fiscaliza e o seu alcance aos clientes das sociedades supervisionadas. Destarte, a Circular Susep n.º 666/2021 classifica como “riscos de sustentabilidade” aqueles que englobam riscos climáticos, ambientais e sociais, atribuindo responsabilidades para serem implementadas internamente pelas sociedades supervisionadas, e externamente, com políticas que podem premiar e estimular práticas ESG pelos clientes do setor.
Dessa forma, com o advento da Circular em questão, o mercado deve adotar a gestão de riscos ESG em suas atividades, sendo de responsabilidade das sociedades supervisionadas avaliar os riscos de sustentabilidade que possam afetar a própria empresa ou terceiros com os quais se relacionam e que possam ter o potencial de causar danos às suas atividades, afetar a demanda por seus produtos ou serviços ou causar variações desfavoráveis no valor de seus ativos ou passivos. Trata-se de uma importante e necessária ferramenta para a manter a higidez do setor de seguros e, por extensão, de todo o setor econômico, haja visto que os riscos de sustentabilidade “podem se materializar em diversos tipos de riscos financeiros e, portanto, devem, sempre que possível, ser integrados à gestão dos riscos de subscrição, de crédito, de mercado, operacional e de liquidez”.
Em relação aos efeitos sobre os clientes das sociedades supervisionadas, a Circular prevê que sejam implementados critérios e procedimentos para precificação e subscrição de riscos, conforme disposto no artigo 5º a seguir transcrito:
Art. 5º A supervisionada deverá implementar critérios e procedimentos para precificação e subscrição de riscos, com ou sem imposição de condições especiais, que levem em conta, no mínimo:
I - o histórico e comprometimento do cliente na gestão de riscos de sustentabilidade;
II - a capacidade e a disposição do cliente em mitigar os riscos de sustentabilidade associados à transação; e
III - eventuais restrições ou limites aplicáveis, nos termos do art. 4º, inciso II.
Parágrafo único. Os critérios e procedimentos de que trata o caput deverão:
I - ser integrados à gestão do risco de subscrição; e
II - constar expressamente da política de subscrição e/ou dos normativos internos a ela relacionados.
A partir da leitura deste artigo, nota-se a criação de critérios que poderão não só garantir uma melhor precificação em observância à realidade de clientes face aos seus riscos de sustentabilidade, como também estimular práticas de mitigação de riscos e ESG.
Dito isto, paralelamente, tem-se que o Open Insurance é um ecossistema aberto e interoperável onde os dados das empresas e instituições integrantes do mercado e dos clientes que tenham previamente consentido, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas, são compartilhados com segurança, estimulando a concorrência e a inovação. Essa infraestrutura de dados pode ser um poderoso veículo para a integração dos critérios ESG, permitindo que as sociedades supervisionadas avaliem melhor os riscos e desenvolvam produtos que possam incentivar práticas sustentáveis. O Open Insurance, portanto, pode auxiliar as sociedades supervisionadas a criar ofertas de produtos e serviços alinhadas com as preferências de consumo consciente e de responsabilidade social, ambiental e corporativa.
Nesta toada, o Open Insurance pode fornecer a base para análises de risco mais profundas e detalhadas, incorporando dados ESG no processo de avaliação de riscos. Através desta lente, as sociedades supervisionadas podem desenvolver modelos de precificação mais precisos e produtos de seguros inovadores que refletem os riscos e oportunidades associados às mudanças climáticas e aos imperativos sociais, exatamente em linha com o disposto no artigo 5º da referida circular e com o apresentado na exposição de motivos que culminou na sua edição, senão vejamos:
Está previsto, ainda, que a supervisionada deverá implementar, sempre que pertinente, critérios e procedimentos para precificação e subscrição de riscos que considerem o histórico e o comprometimento do cliente na gestão dos riscos de sustentabilidade, sua capacidade e disposição para mitigá-los, além de eventuais limites e restrições, quando aplicáveis.
A combinação do Open Insurance com os princípios ESG abre o caminho para a criação de produtos que podem recompensar práticas sustentáveis, como por exemplo seguros com prêmios mais baixos para edifícios verdes ou empresas com cadeias de suprimentos éticas. Isso não só estimula a adoção de melhores práticas entre as empresas seguradas, mas também ressoa positivamente com os consumidores que valorizam a sustentabilidade.
A transparência e o compartilhamento de dados oferecidos pelo Open Insurance, aliados com a conscientização crescente sobre a sustentabilidade, podem ajudar a construir um setor de seguros mais resiliente e adaptado aos desafios do século XXI. As empresas que liderarem em ESG e aproveitarem as capacidades do Open Insurance não só estarão à frente na inovação, mas também se posicionarão como líderes em responsabilidade corporativa e confiança do consumidor.
Priscila Figueiredo
Via Internet Insurance Consulting
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