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Foto do escritorRodrigo Paiva

A corrida do Open Insurance e o efeito Bannister


O que um estudante de medicina da Universidade de Oxford nascido nos anos 20 pode nos ensinar sobre o atual momento do Open Insurance?


efeito Bannister

Aparentemente, parecem universos desconexos. Mas se olharmos com mais atenção é possível extrair lições valiosas que nos ajudam a identificar que estamos diante de um momento que marca a grande a virada de chave do mercado em direção ao Open Insurance.


No livro “The pursuit of excellence: The Uncommon Behaviors of the World's Most Productive Achievers” (Em tradução livre: A busca pela excelência: os comportamentos incomuns dos empreendedores mais produtivos do mundo), o autor Ryan Hawk nos conta a história desse estudante e, por meio dessa narrativa, identifica alguns padrões de comportamento entre pessoas que realizam grandes feitos, independente da sua área de atuação.


Ocorre que esse estudante, Roger Bannister, era também um entusiasta dos esportes. Tinha o sonho de ser remador e competir contra Cambridge na tradicional competição entre as instituições no rio Tamisa. Mas do alto dos seus 1.80 metros e com apenas 68 quilos, acabou sendo convencido que era grande e leve demais para o esporte. Esse biotipo, porém, poderia lhe dar alguma vantagem na corrida, esporte que ele começou a se dedicar, na modalidade de 1 milha (algo como 1,6 quilômetros). E aqui começa a história de Bannister que, prometo, vamos conectar ao Open Insurance logo mais.


Até então, a modalidade de 1 milha vinha sendo dominada por dois suecos, Gunter Hagg e Arne Andersson, que se alternaram ferozmente na quebra do recorde ano após ano entre 1942 até 1945, quando Hagg estabeleceu a marca de 4:01.04 minutos. O mundo do esporte já debatia há 70 anos quem seria o primeiro ser humano a correr 1 milha em menos de 4 minutos. E Hagg chegou bem perto disso, dando esperanças de que essa barreira finalmente poderia ser quebrada em breve.


A barreira de 4 minutos acabou se tornando uma obsessão para os atletas, mas o recorde de Hagg ainda ficou intacto por muitos anos. Já havia especialistas que defendiam que a barreira nunca seria quebrada, pois a limitação física humana teria sido atingida.


Alheio a tudo isso, Bannister seguia sua rotina de estudos e treinos, sendo que sua maior dedicação sempre foi ao estudo da medicina. Seu objetivo maior era se tornar neurologista e a corrida era uma espécie de hobby que ele dedicava apenas uma hora do seu dia. Bannister tentava compensar essa falta de tempo nas pistas adotando uma abordagem científica em seus treinos. Como futuro neurologista, ele acreditava que a preparação mental era tão importante quanto a preparação física. Antes de cada treino ele imaginava o seu desempenho, visualizava a si mesmo na linha de chegada e criava uma atitude mental positiva. Ao final de cada treino ele anotava impressões sobre sua “atitude mental”. Em uma dessas notas ele escreveu: “The mental approach is all-important because the strength and power of the mind are without limit. All this energy can be harnessed by the correct attitude of mind.” (Em tradução livre: A abordagem mental é muito importante porque a força e o poder da mente são ilimitados. Toda essa energia pode ser aproveitada pela atitude mental correta).


Em 6 de maio de 1954, um dia frio e chuvoso na pista de Iffley, da Universidade de Oxford, Bannister se prepara para correr mais uma prova. Os especialistas, céticos, decretam que a barreira dos 4 minutos só poderia ser quebrada em condições absolutamente perfeitas: clima ameno, sem vento, pista seca. O exato oposto das condições naquele dia. Bannister ignorou todos os fatores adversos externos e não só venceu a corrida como marcou o inacreditável tempo de 3:59.4, se tornando o primeiro ser humano a correr 1 milha em menos de 4 minutos! O aspirante a neurocientista e atleta nas horas vagas acabava de se tornar uma lenda do esporte mundial.


Tá bom, impressionante, mas o que isso tudo tem a ver com Open Insurance?


Calma, vamos chegar lá. Para conectar esse grande feito do atletismo ao OPIN, precisamos ainda saber o que aconteceu APÓS a quebra do recorde.


Depois de uma expectativa de mais de 70 anos, de especialistas afirmando que a limitação física humana havia sido atingida, Roger Bannister quebra a barreira dos 4 minutos e mostra ao mundo que era possível.


É isso, Bannister havia quebrado a barreira psicológica. A limitação mental.


O resultado disso é que em menos de dois meses depois de seu feito, outro atleta - o australiano John Landy - cravou 1 milha em 3:58.0 minutos.


O curioso é que o mesmo Landy no começo daquele ano, após marcar tempos em torno de 4:02 em 4 provas seguidas, declarou:


Honestly, I believe the 4-minute mile is beyond my capabilities. Two seconds may not seem like much, but to me it's like trying to walk through a cement wall”.

(Em tradução livre: “Francamente, eu acredito que a milha de 4 minutos está além da minha capacidade. Dois segundos podem não parecer muito, mas para mim é como tentar atravessar um muro de cimento.”)

E no ano seguinte outros 3 atletas marcaram tempos abaixo dos 4 minutos, deixando claro que o modelo mental era a única coisa que os separava do resultado.


O estudante-atleta Bannister fez muito mais que marcar um novo recorde esportivo. Ele comprovou que a mudança no modelo mental é determinante para ser bem-sucedido.


E é aqui que finalmente conectamos toda essa história ao atual momento do Open Insurance.

O OPIN representa mais do que apenas uma mudança tecnológica. É fundamentalmente uma mudança de mentalidade, que coloca todo o poder nas mãos do consumidor.


Repito: Há uma importante mudança de modelo mental em curso no mercado de seguros.


O consumidor, cada vez mais habituado e confortável no meio digital, já fez essa virada de chave mental e tem a expectativa de que o mercado deve lhe prover produtos e serviços mais personalizados, com melhor custo-benefício e com menos atrito no ciclo de contratação e uso da solução.


Para atender essa expectativa, o mercado – impulsionado pela regulação estatal – ajusta seus processos e adota tecnologias que permitam entregar o que o consumidor demanda.


Ele - o consumidor - está dando as cartas. E a indústria está agora correndo para se requalificar e atender às expectativas.


Ao contrário do que alguns acreditam, o OPIN não é fruto de uma obrigatoriedade aleatória do poder público. O OPIN é uma consequência da mudança de modelo mental da sociedade. Os órgãos reguladores apenas se viram obrigados a ajustar as práticas de mercado aos anseios da sociedade.


  • Portanto, como já vimos, o consumidor já fez a virada de chave no seu modelo mental.

  • O regulador, ainda que existam possíveis aprimoramentos futuros, já fez sua virada de chave no modelo mental e criou as bases regulatórias para o Open Insurance.

  • As seguradoras também estão investindo em tecnologia e fazendo (voluntariamente ou compulsoriamente) sua virada de chave mental.

  • Os anúncios públicos das primeiras SPOCs (Sociedade de Processamento de Ordem do Cliente) mostram que os corretores de seguros também estão dando os primeiros passos na direção dessa mudança no modelo mental.



As SPOCs vão provocar o efeito Bannister


Considero que a constituição de uma SPOC é a quebra de uma barreira similar à barreira dos 4 minutos. Desde que a SUSEP criou a SISS (inspirada no modelo do Open Banking) e posteriormente corrigiu o modelo para a SPOC - dando corretamente o protagonismo da atividade ao corretor de seguros - muito tempo se passou e já havia pessoas do mercado dizendo que essa barreira era intransponível. Por um longo período não surgiu ninguém determinado a quebrar essa barreira e credenciar uma SPOC. Após os anúncios da SPOC da Fenacor e da Guru, assim como o recorde de Bannister, é esperado agora que outras SPOCs de corretores sejam anunciadas na sequência e que o mercado incorpore de vez a lógica do Open Insurance em suas relações com o consumidor. Esse é o elemento chave para a mudança mental definitiva no mercado.


Na história de Roger Bannister aprendemos que as previsões dos especialistas nem sempre estão corretas. E há hoje no mercado de seguros alguns especialistas, pessoas competentes e experientes, ainda classificando o Open Insurance como um problema a ser combatido e não uma como uma grande oportunidade.


Pessoas com papel relevante no mercado que estão publicamente se colocando contra o Open Insurance, apenas porque não foram capazes de enxergar a mudança de mentalidade da sociedade. Não compreenderam, ainda, que se colocar contra o Open Insurance é o mesmo que se colocar contra os anseios do próprio consumidor – e em última análise contrapor o corretor de seguros, pois esse é o profissional que tem o papel de representar e defender os interesses do segurado. Essa é uma limitação de visão perigosa, pois sabemos que ignorar os desejos do cliente é algo que costuma ser fatal no mundo dos negócios.


Por isso, felizmente, eu não acredito que essa postura de combater o OPIN perdure. A realidade vai se impor simplesmente porque quem não se alinhar aos desejos dos clientes estará fora do mercado em pouco tempo.


Uma lição estóica


Comecei esse artigo com a pergunta O que um estudante de medicina da Universidade de Oxford nascido nos anos 20 pode nos ensinar sobre o atual momento do Open Insurance?”. Meu objetivo era de provocar curiosidade e incentivá-lo a seguir a diante na leitura. Se você está lendo essas linhas, parece que funcionou. Vou finalizar o artigo voltando ainda mais no tempo. Não para os anos 20, mas para o ano 63 d.C. Esse foi o ano em que Sêneca, um importante filósofo e escritor, considerado um dos pais do estoicismo, escreveu uma série de cartas ao seu amigo Lucílio.


Lucílio foi um cavaleiro romano e procurador imperial da Sicília. Já no final de sua vida, Sêneca escreveu cartas ao amigo com o objetivo de ajudá-lo em seu desenvolvimento pessoal.


Conhecemos 124 cartas, cada uma com um tema distinto. Quero falar sobre um trecho da carta XIII que tinha como tema “Sobre medos infundados”.


Nela, há uma frase célebre de Sêneca, que pode nos ajudar muito a refletir sobre como reagimos aos acontecimentos que nos geram dúvida e medo:


“Existem mais coisas susceptíveis de nos assustar do que existem de nos derrotar; sofremos mais na imaginação do que na realidade”.


Bannister (o dedicado estudante que talvez tenha lido Sêneca) sabia que a barreira dos 4 minutos era uma limitação inventada na cabeça de especialistas e que não existia na realidade factual.


E isso nos ajuda a compreender o que se passa nesse momento no mercado de seguros. Algumas pessoas (uma minoria, felizmente) estão enxergando (ou criando) fantasmas onde eles não existem. Estão antecipando uma ameaça que não é real. Pelo contrário, a história nos mostra que todas as vezes que o mercado seguiu na direção de atender os desejos dos clientes, só colheu crescimento e desenvolvimento.


Assim como a quebra da barreira dos 4 minutos desencadeou uma nova era na corrida de média distância, o Open Insurance está pavimentando um novo e instigante caminho no setor de seguros que deverá derrubar antigas barreiras e abrir novos horizontes.

O mercado de seguros, impulsionado pelo Open Insurance, está no limiar de uma transformação significativa. A digitalização e o correto tratamento de dados dos clientes não só otimizam processos, mas também criam oportunidades para produtos mais personalizados e serviços mais eficientes. Esta não é uma corrida contra o cronômetro, mas em direção a um futuro em que a transparência, a eficiência e a personalização serão mais valorizados e agregarão alto valor aos produtos de proteção a riscos.


Neste cenário de acelerada evolução, quem se adaptar mais rapidamente à realidade imposta pelo novo modelo mental da sociedade colherá os melhores frutos. Serão aqueles que adotarão novas maneiras de atender e exceder as expectativas dos clientes.


Mais uma vez podemos recorrer à sabedoria de Sêneca: "Não é porque as coisas são difíceis que não ousamos; é porque não ousamos que elas são difíceis" (Carta CIV - Sobre o cuidado com a saúde e a paz mental).


O desafio para o setor de seguros é ousar, inovar e, como Bannister, ultrapassar as fronteiras do que se acredita ser possível. Seja por meio da SPOC da Fenacor, da SPOC Guru, ou de outra que vier a surgir no mercado, os corretores mostram o caminho e dão o recado: o futuro é Open e é inevitável.


O futro é Open


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